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Varejistas tentam adiar nova regra para marketplaces
Grandes companhias de “marketplace” (shopping virtual) do país tentam adiar a implementação de uma nova regra de liquidação de pagamentos, definida pelo Banco Central (BC), e que vai atingir diretamente o negócio dessas empresas. Uma nova reuni
Grandes companhias de “marketplace” (shopping virtual) do país tentam adiar a implementação de uma nova regra de liquidação de pagamentos, definida pelo Banco Central (BC), e que vai atingir diretamente o negócio dessas empresas. Uma nova reunião entre as partes deve ocorrer nesta semana. Neste momento, a data definida para que a mudança passe a valer é 4 de setembro.
Grupos como Walmart, B2W, Mercado Livre e Via Varejo estão definindo um plano para se adaptar à exigência. Pelo já determinado pelo BC, após setembro, todo o fluxo financeiro de pagamentos dessas companhias será compensado e liquidado na Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP), que já é responsável por boa parte das transações bancárias no país.
Pelo definido, todas as empresas que atuam na cadeia de venda do “marketplace” deverão estar credenciadas e homologadas na CIP. E serão obrigadas a liquidar suas operações dentro do sistema da câmara. Isso porque, segundo o advogado Erik Nybo, da SBAC Advogados, há uma preocupação do BC com o risco sistêmico que os “marketplaces” podem representar ao mercado pelo crescente volume de transações. São os varejistas que repassam aos lojistas, clientes do “marketplace”, o valor da compra feita pelo consumidor.
O “marketplace” funciona como uma espécie de shopping on-line. Lojistas hospedam suas operações nos sites de redes como Casas Bahia e Americanas.com, que cobram uma comissão por isso. A cada venda, as grandes cadeias recebem o montante e é feita uma divisão (split) dos valores. Parte vai para o cliente lojista e parte fica com a rede – até 15%. Hoje 25% das vendas do comércio eletrônico são feitas pelo modelo de “marketplace”, segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico, o que deve representar um volume de cerca de R$ 10 bilhões em 2017.
Há uma série de impactos com a mudança que variam de acordo com o tipo de negócio. Segundo apurou o Valor, o BC solicitou às empresas, na semana passada, que definissem esses efeitos em um relatório e o entregassem à autarquia nesta semana. Uma das questões centrais – além da necessidade de discutir como se adaptar à exigência da liquidação dentro da CIP – está no efeito financeiro da medida. É que a regra afeta um dos tripés do negócio, que ajuda na rentabilidade do “marketplace”.
Trata-se da condição de as varejistas anteciparem recebíveis para os clientes (lojistas). Atualmente, grupos como Via Varejo (dona de Ponto Frio e Casas Bahia) e B2W (Submarino, Americanas.com) oferecem esse serviço financeiro, considerando que elas, como intermediárias, têm acesso aos recursos das transações de compra e venda. Mas o lojista também pode antecipar valores em contas em bancos. Como os dados que transitam pelo sistema do “marketplace” não são visíveis pelo mercado, não dá para saber o volume real de antecipação dos lojistas.
“O lojista tem uma trava bancária e estavam existindo ‘desvios’ nessa trava. O que o BC quer fazer é ampliar esse controle”, diz a advogada Vanessa Fialdini, da Fialdini Associados. Se isso ocorrer, limites de antecipação por meio do “marketplace” podem cair.
As empresas do setor entendem que o serviço financeiro deve ficar “prejudicado”, como diz Stelleo Tolda, vice-presidente de operações do Mercado Livre. “Se não ganhar com isso, a rentabilidade das companhias [de marketplace] terá que vir de outro lugar”, afirma.
Outro efeito esperado envolve as carteiras de créditos dos sites de compra coletiva. Como os clientes pagam por serviços, mas não resgatam na hora, esse crédito era lucro direto para as empresas, como antecipou na semana passada o site “Brazil Journal”, em artigo sobre a nova regra. Com a liquidação centralizada, isso deixa de existir.
Há um temor em torno de desequilíbrios dentro dessa nova estrutura montada em torno do “marketplace”. Como o varejo passou a operar dentro da cadeia de pagamentos, se as redes (especialmente as médias) deixam de pagar os lojistas hospedados nos seus sites, ou estendem esses prazos, há risco de colocar pequenas lojas em situação difícil, dizem especialistas.
Neste momento, as varejistas estão avaliando como vão se adaptar à exigência de liquidar as operações dentro da câmara. Há duas alternativas possíveis: contratar um credenciador ou facilitador de pagamentos para fazer essas atividades em seu lugar (que tem sistemas que “conversam” com a CIP) ou fazer, ele mesmo, a adequação dos sistemas para a compensação das operações na câmara. Nesse caso, ele ainda precisará usar um intermediário habilitado a se comunicar com a rede da CIP – podendo ser uma empresa especializada, como a RTM, ou um banco.
O Valor ouviu Via Varejo, Walmart e Mercado Livre, e a tendência é que optem por um caminho misto – um acordo com um adquirente e posteriormente, um sistema próprio. Mas não há decisão tomada. Procurado, o Magazine Luiza informa que “está a par [do tema] e preparado para qualquer mudança de regulação”. Há um grupo de trabalho formado pelas empresas em contato com o BC.
A questão principal nessa escolha é o custo: gastar com o desenvolvimento interno, ou pagar um terceiro? “O pequeno não vai conseguir [desenvolver]. Terá que usar um terceiro. Para um grande, olhando no médio prazo, dependendo do volume, isso fica caro [e é melhor desenvolver]”, disse Maurício Salvador, da Abcomm.
Nesse formato, os varejistas contratam, inicialmente, empresas como Cielo, Rede e Stone, conhecidos como adquirentes, ou MoIP e Aceita Fácil, os subadquirentes, que estão habilitadas para compensar operações na CIP. Ao mesmo tempo, vão desenvolvendo sistemas próprios. Alguns já começaram esse trabalho e pensam em ir além da conexão com a câmara.
“Não queremos fechar portas agora, então umas das discussões é virmos a ser adquirentes. ‘Marketplace’ é muito estratégico para nós. Então, no momento a possibilidade é ter um acordo com alguma empresa e posteriormente uma migração para um sistema próprio. Mas não há nada decidido”, diz Felipe Negrão, diretor de finanças, produtos e serviços financeiros da Via Varejo.
O Walmart começou a discutir soluções possíveis em 2013, e depois desacelerou o projeto. “Estamos resgatando o que fizemos para verificar se vamos desenvolver um sistema como adquirente ou não. O prazo é curto. É possível que fechemos um acordo com alguma adquirente e depois migremos para um sistema nosso”, diz Paulo Silva, diretor do Walmart. Segundo Salvador, da Abcomm, o investimento em um sistema desse tipo vai depender de como está estruturado o ambiente de tecnologia do varejista, se é compatível com as exigências da CIP, ou não, e pode chegar a alguns milhões de reais.
De acordo com Augusto Lins, diretor de relações institucionais da Stone, a empresa está trabalhando para oferecer o serviço de “split” com um custo baixo ou até mesmo sem custo adicional para os clientes, a depender da negociação. “A tendência é que sejamos capazes de prover uma solução que não vai ter dor operacional nem de custo”, afirmou. A definição, segundo ele depende da publicação das regras da CIP. O Valor apurou que a câmara pretende divulgar o custo das transações ainda nesta semana.
A nova regra para os “marketplaces” é um desdobramento do marco regulatório para os pagamentos eletrônicos de 2013. Ela foi publicada em setembro de 2015 e o prazo de 4 de setembro para entrar em vigor está previsto em circular de dezembro de 2016. As discussões sobre como se adequar a ela, no entanto, só começaram há cerca de dois meses. De acordo com um executivo que não quis ter seu nome revelado, as empresas se valeram do histórico de adiamentos de prazos pelo BC para protelar suas movimentações.
“Assim como já houve outros casos de adiamento, todo mundo espera que vai acontecer isso desta vez também”, disse a fonte, mas ressaltou que, até agora, a autarquia tem se mostrado pouco disposta a mudar a data.
Procurado, o Banco Central (BC) informou, por meio de nota, que a prestação de serviço de pagamento é uma atividade de interesse público e, por isso, demanda regras mínimas de conduta. “O BC também entende que a padronização trazida pela implantação da liquidação centralizada facilitará a troca de informações básicas das transações de pagamento, informações essas que todas as empresas que participam do fluxo de pagamento devem possuir.”
O BC lembra, ainda, que a regulação para a liquidação centralizada foi tornada pública em 2015 e que desde dezembro de 2016 foi estabelecido o prazo de 4 de setembro para sua entrada em vigor. Ainda em nota, o BC informa que as novas regras querem garantir ganhos de eficiência para o mercado e buscam acabar com ineficiências trazidas pela existência de múltiplos prestadores de serviço de compensação e de liquidação. O BC diz ainda que tem atuado para esclarecer agentes do mercado, e para avaliar se serão necessárias novas medidas.